íder entre os restaurantes de fast food no Brasil, o McDonald’s quer crescer ainda mais no país com tecnologia, flexibilidade e uma escuta cada vez mais ativa dos clientes. A flexibilidade é visível no cardápio: na pandemia, a rede enxugou o mix de ofertas e se concentrou nos clássicos.
Agora, com inflação em alta, lançou mais sanduíches de frango, já que o preço da carne bovina disparou, conta Paulo Camargo, CEO da Arcos Dorados no Brasil, empresa que opera a rede McDonald’s na América Latina e no Caribe.
O acesso aos restaurantes também se adaptou, com o que o executivo apelidou de “drive-tudo” para a venda de comida para levar. “Vem gente de cavalo, carroça, skate, mobilete, patins”, diz.
Na frente tecnológica, a rede vai lançar, em parceria com a Stellantis (gigante automobilística que surgiu da união de Fiat e PSA) a modalidade de pagamento já integrado no kit multimídia do automóvel.
Em entrevista ao GLOBO, o executivo reforçou sua confiança no potencial do Brasil, apesar das turbulências atuais: “Continua sendo o país do futuro, independente das confusões que estamos vivendo neste momento.”
A América Latina foi uma das regiões mais afetadas no mundo pela pandemia. Como a Arcos Dorados passou por esse momento?
Foi muito complicado. As vendas caíram 80% no setor, para todo mundo. Quem tinha canais como delivery e drive-thru se saiu melhor. Buscamos ressignificar para o cliente aquilo que nós chamamos de conveniência. Durante muito tempo, conveniência para o varejo era estar na melhor esquina. Agora, conveniência é fazer uma escuta ativa do cliente. É empatia, é ouvir. E nós adotamos a estratégia 3Ds — delivery, digital e drive-thru. E isso nos permitiu atravessar esse momento. Temos hoje 1.045 restaurantes, abrimos 28 este ano. Quando chegou no último trimestre de 2020, já estávamos fazendo 90% da venda pré-crise.
O cardápio nesse período da pandemia diminuiu. Um dos itens que saiu foi o McFish, que vai voltar de maneira temporária, com campanhas específicas. O que fizemos foi simplificar a vida de todos, do consumidor e do fornecedor, concentrando nos produtos que mais vendiam. As pessoas estavam confinadas e queriam comer os clássicos. Ninguém acorda de manhã pensando assim “estou doido para comer a salada do McDonald’s”. As pessoas queriam BigMac, Quarteirão, Cheddar, batata. Antes da pandemia, a gente chegou a ter seis saladas no cardápio, mas a participação em vendas era muito pequena.
No Brasil o drive-thru cresceu muito? É um canal que tende a ser relevante?
Sim. A pandemia começou e ainda não terminou. E não sabemos como vai ser esse futuro. No drive-thru nós sabemos que vamos investir. Praticamente todas as lojas que estamos abrindo são de rua com estacionamento e drive-thru. É aquela loja “maiorzona” do McDonald’s. Temos de duas a três vezes mais lojas desse tipo que os principais concorrentes. E isso explica a melhor performance que temos tido. O cliente não ia no shopping center (na pandemia), e quem dependia do shopping ficou em situação um pouco mais complicada. Isso é uma estratégia mundial do McDonald’s.
Fala-se muito da tendência dessas novas gerações de não usarem carro, o que é verdade. Mas, no nosso caso, sabemos que isso vai levar um tempo para acontecer. Se você pegar a quantidade de veículos que têm sido emplacados (no Brasil), os números têm aumentado. E dentro desse conceito, criamos o “drive-tudo”, você vem como quiser. Incrivelmente, vai cavalo, carroça, skate, mobilete, patins. O pessoal está curtindo isso.
Como foi a estratégia de aportuguesar a marca e usar “Méqui” nos letreiros de algumas lojas?
Além de ganhar o estômago do cliente com os sanduíches, fritas e sobremesas, cabe a nós manter o legado da marca que tem mais de 40 anos no Brasil. O McDonald’s tem uma conexão emocional com o brasileiro. E todo mundo, quando gosta de alguém, cria um apelido carinhoso. E nesse caso o apelido era Méqui. A verdade é que, em 40 anos, a gente fez as coisas sempre do mesmo jeitinho.
O cliente falava “eu gosto do McDonald’s, mas o serviço está muito robotizado”. O Méqui vem como a cereja do bolo, mas houve várias coisas acontecendo, como a troca do uniforme, a mudança do “McFritas Acompanha” (frase que todo atendente repetia a cada pedido de sanduíche), que parou de ser falado e o funcionário passou a falar de uma maneira mais coloquial com as pessoas. A parte mais difícil foi explicar para os americanos o que a gente queria fazer, e eles entenderam.
E como os convenceu?
Já tínhamos feito pesquisas e informado que faríamos uma campanha criativa em relação ao uso de um nickname (apelido) brasileiro. E coincidentemente tínhamos uma reunião com o CMO (diretor de Marketing) global em Chicago. E a maneira mais simples de explicar foi essa: “Cara, eu não sei com você, mas minha mãe, quando queria chamar minha atenção, me chamava de Paulo Sérgio. E quando me chamava de Linho, que era o meu apelido, eu sabia que era legal”. Quando expliquei assim, ele adorou e disse “vai em frente”.
Neste momento de reabertura maior da economia, com o avanço da vacinação, a alta da inflação e a pressão dos custos preocupam?
Os restaurantes que estamos abrindo agora foram planejados em 2019. O McDonald’s hoje já tem um planejamento para os próximos seis anos sobre onde vamos estar e quantos vamos abrir. Obviamente, pode mudar algo para lá e para cá, mas temos essas diretrizes.
Tem um outro lado que é a mudança do escritório, o home office. Qual vai ser a realidade de lojas que estavam em áreas comerciais? Quem disser que sabe, parabéns. Eu não sei como será o futuro. Pode ser que a gente venha a fechar restaurantes porque em determinado local havia vários escritórios, e o pessoal agora está todo em casa. Mas isso ainda não aconteceu.
Em relação aos preços, houve uma inflação forte, e continua acontecendo. Tudo que você come subiu de preço. Temos contrato e relação de longo prazo com esses fornecedores. O preço é uma das variáveis. Outra variável é o mix. É o quanto vou vender de cada item, como sorvete, sanduíche e batata.
E, entre os sanduíches, o preço da carne bovina aumentou muito. Então, vou fortalecer minha plataforma de frango. Na nossa última campanha, transformamos um McChicken em quatro McChickens. Temos a pessoa que gosta disso vindo mais vezes, e quem não gostava muito está vindo conhecer. Há várias formas de mitigar esse impacto. É um fato que a inflação de alimentos tem sido um complicador na vida de todos os restaurantes.
A atual turbulência política no Brasil também afeta os planos do McDonald’s?
O planejamento vai sempre acontecer e eventualmente vai ser alterado se condições mudarem. O McDonald’s está aqui há mais de quatro décadas, e o meu trabalho é ter certeza de que vai ficar mais décadas e décadas. O potencial é porque temos baixa penetração em toda a América Latina, não só no Brasil.
Temos no máximo um quarto da penetração (aqui) que temos nos EUA. O Brasil continua sendo o país do futuro. Crescemos ouvindo isso, mas o fato é que o potencial continua, independentemente das confusões que estejamos vivendo neste momento.
Como a tecnologia está mudando a experiência do consumidor?
Nessa parte da ressignificação da conveniência, o consumidor já vinha falando que queria controlar mais a experiência, o que vai pedir, como vai pagar e onde vai comer. Criamos o McSem Fila através de um app. São mais de 30 milhões de downloads. As pessoas podem pedir pelo app e retirar na loja. E estamos implementando essa mesma versão no drive-thru e também para o carro que não quer passar pelo drive-thru e quer parar no estacionamento.
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Fazemos parte do Cart, a nova plataforma da Stellantis. Já está em teste e vai chegar ao consumidor no segundo semestre deste ano. Basicamente, você está no multimídia do seu automóvel e tem ali a solução de pagamento integrada com alguns parceiros. Nós somos um deles. Isso vai permitir que você faça o pedido do seu automóvel. Muita coisa está acontecendo no mundo do drive-thru.
Com a chegada do 5G (nova geração de telecom), vocês podem criar novos canais?
Sem dúvida. Tudo será muito mais rápido. Tem a conectividade e tem o big data, com a capacidade de processar esses dados. Dá para saber as preferências de cada um dos CPFs. O futuro é esse. É deixar de ter marketing massivo e fazer uma personalização massiva nessa relação com o cliente.
Fonte: O Globo