Por trás da aquisição da participação do BB (Banco do Brasil) no banco digital Digio anunciada na última sexta-feira (8), se esconde um apetite maior do Bradesco de investir para acelerar o ritmo de crescimento do negócio, em um ambiente de acirramento da competição com as fintechs.
O banco informou ter chegado a um acordo para a compra da participação de 49,99% do Banco do Brasil no Digio por R$ 625 milhões. Com a operação, o Bradesco passará a deter 100% do capital social do banco digital, criado pelas duas instituições financeiras em 2015.
A conclusão está sujeita ainda à aprovação do BC (Banco Central) e do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Em comunicado ao mercado, o Bradesco afirmou que a aquisição faz parte da estratégia de investir em empresas digitais, buscando diversificar sua atuação e seu público.
Segundo Marcelo Noronha, vice-presidente do Bradesco, com a conclusão da aquisição, o Digio passará a representar uma nova frente independente de crescimento dentro do conglomerado, que conta ainda com a própria marca do banco, e da iniciativa também no campo digital via banco Next.
“A gente não podia acelerar mais o negócio porque tinha outro acionista, e o outro acionista às vezes tem uma estratégia distinta da sua”, diz Noronha. “É uma questão de estratégia de cada um, não tem certo ou errado, mas nossa disposição de investir [no Digio] era maior que a do BB”, acrescenta o executivo.
“Estima-se impacto no resultado do BB, via equivalência patrimonial, de aproximadamente R$ 175 milhões e não há efeito material no capital”, informou o Banco do Brasil. Procurado, o Digio disse apenas por meio de sua assessoria que o tema está sendo conduzido pelos acionistas.
Noronha afirma que ainda irá sentar com o time do banco digital, liderado pelo presidente da empresa, Giovane Neves, para bater o martelo quanto aos planos de expansão previstos à frente, bem como relativos aos investimentos necessários para colocá-los de pé.
“O negócio está crescendo, mas pode ser acelerado”, afirma o vice-presidente do Bradesco, que aponta “planos ambiciosos de crescimento” para 2022.
O Digio possui uma carteira de crédito de R$ 2,5 bilhões, com aproximadamente 2 milhões de cartões. O banco digital oferece serviços como abertura de conta, crédito pessoal, gratuidade em operações de TED e saque em caixas eletrônicos, entre outros.
No primeiro semestre de 2021, o banco digital registrou lucro líquido de R$ 36,7 milhões, revertendo o prejuízo de R$ 9,2 milhões no mesmo período do ano passado. Em março, foi aprovado pelos acionistas um aumento de R$ 150 milhões do capital social, que somava cerca de R$ 450 milhões no fim de junho.
“Esse aporte de capital tem como objetivo suportar e consolidar o aumento das operações do Banco Digio através da ampliação do portfólio de produtos para os clientes”, informou o banco digital, em relatório.
O vice-presidente do Bradesco diz que os planos do banco para o Digio passam por um aumento na base de clientes via ampliação no mix de produtos e serviços. “A ideia é passar a oferecer investimentos e também crédito imobiliário, em linhas que sejam de interesse dos clientes”, afirma Noronha.
“Estamos em um momento muito importante para o Digio. Nossa estrutura acionária irá mudar e o Bradesco passará a deter 100% do capital. Seguimos de forma independente, mantendo o nosso DNA e a nossa cultura”, escreveu Giovane Neves, presidente do Digio, em post publicado no LinkedIn no sábado (9).
“Acreditamos ser um passo importante para o nosso crescimento e com novos investimentos poderemos alçar voos ainda mais altos, podendo contar com o know-how e a solidez do grupo Bradesco”, disse o presidente do Digio na publicação.
Segundo Noronha, não há qualquer intenção de fundir as operações do Digio com o banco digital Next, com a manutenção de cada operação completamente segregada uma da outra.
Enquanto o Next já nasceu com toda uma estrutura de produtos e serviços de um banco por trás, só que totalmente no campo digital, no caso do Digio, diz Noronha, o caminho percorrido foi um pouco diferente, mais parecido até com o de algumas fintechs.
“O Digio nasceu mais parecido com o Nubank, passando a oferecer cartão de crédito [em 2016], e pouco tempo atrás [em 2020] que passou a oferecer uma conta”, afirma o executivo.
Ele vê a aquisição como uma “iniciativa pró-competição”, em um contexto de disputa crescente pelos clientes entre instituições financeiras tradicionais e fintechs.
“O Bradesco, junto com outros concorrentes como Itaú e BB, é chamado de incumbente, mas o banco não para de crescer, é só olhar o último balanço”, afirma Noronha.
No segundo trimestre de 2021, o banco registrou lucro líquido de R$ 6,3 bilhões, resultado que representou um aumento de 63,2% em relação ao mesmo período do ano passado.
Em meio ao acirramento da competição no setor, no mês passado, os bancos, por meio da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), chegaram a fazer críticas contundentes às fintechs e aos seus modelos de negócios.
“A ‘verdade’ verdadeira é que as grandes fintechs gostam mesmo é de pagar apenas ‘meia entrada’ e em nada se diferenciam dos bancos. Aliás, só não são bancos para pagar menos impostos, gerar menos empregos, ter poucas obrigações regulatórias e trabalhistas”, atacou a Febraban.
“Quanto mais competição melhor. Acho que tem mercado para todo mundo, e deixa que o cliente faça a escolha dele”, diz Noronha.
O executivo cita ainda acordo recente firmado pelo Digio com a Uber para oferecer linhas de crédito com condições mais vantajosas aos motoristas do aplicativo, que ele avalia como importante alavanca de crescimento para o banco digital, em um ambiente macroeconômico que se desenha cada vez mais desafiador à frente.
No início do mês, o Bradesco piorou as expectativas para algumas das principais variáveis econômicas brasileiras, vendo mais juros e inflação, câmbio mais depreciado e atividade mais lenta em 2022 e também o risco de racionamento de energia como o principal vetor negativo a ser monitorado.
Fonte: Folha