As chamadas lojas de conveniência, sempre abertas ali na esquina ou no posto de combustível, não são mais as mesmas. Os deslocamentos restritos na pandemia forçaram uma rápida reinvenção.
Elas despontam como uma das principais alternativas para o consumidor encher a despensa sem ir longe de casa e, com a chegada de novas redes ao Brasil e uma aposta maior de revendedoras de combustíveis e de grandes varejistas brasileiras no segmento, tornaram-se o novo campo de batalha do comércio, avaliam especialistas.
A mexicana Oxxo é a mais nova do setor a ampliar sua presença no Brasil. Vai concorrer com pesos pesados, como a mais recente associação do setor, entre a Vibra (nome adotado pela BR Distribuidora após a privatização) e as Lojas Americanas.
E competir ainda com multinacionais com marcas já consolidadas aqui, como Carrefour Express e as lojas Pão de Açúcar Minuto e Mini Extra. Enquanto isso, a AmPm, maior do setor e que opera majoritariamente em postos Ipiranga, planeja abrir unidades em condomínios e lojas de rua.
A maior concorrência vem com uma oferta maior de produtos e lojas mais tecnológicas. Nos postos de combustíveis, já há vendas em estilo drive thru. Muitas oferecem pagamentos por aproximação e, nas lojas de rua, até mesmo self checkout, em bancas sem funcionários, além de pedidos por aplicativos de entrega e programas de cashback (recompensas em dinheiro).
— As lojas de conveniência avançaram nos canais digitais, passaram a oferecer itens de higiene e mercearia, por exemplo. E estão deixando os postos de gasolina e indo para a rua — resume Ana Paula Tozzi, presidente da consultoria AGR, especializada em varejo.
No Brasil, no segmento original de lojas associadas a revendedores de combustíveis, são 8.100 unidades, cobrindo apenas 20% dos 40 mil postos do país. No Chile, as lojas estão presentes em 33% dos postos e, na Argentina, em 50%.
Nos Estados Unidos, 94% dos postos têm lojas de conveniência. Esse mercado movimenta cerca de R$ 7 bilhões ao ano, mas a concorrência também se acirra em lojas de rua, condomínios e terminais de ônibus.
Alianças estratégias
Com operação comandada pelo Grupo Nós, que une a brasileira Raízen (maior produtora de etanol do país e operadora da rede de postos Shell) com a mexicana Femsa, do setor de bebidas, a Oxxo acelerou sua expansão no Brasil.
Nas principais cidades do México, é difícil achar esquina sem a presença da marca, que já é a maior rede de mercados de proximidade da América Latina. São mais de 19 mil unidades em países como Peru e Chile.
A rede mexicana abriu a primeira loja em Campinas, no interior de São Paulo, em 2020. Hoje, já são 40 no estado. São pequenos mercados estrategicamente posicionados em bairros ou regiões com grande circulação, como estações de metrô e terminais de ônibus.
Oferecem um mix de produtos de reposição da despensa, dos itens de cesta básica aos de higiene e limpeza, com comidas rápidas e bebidas geladas.
— Seguimos acreditando fortemente na migração do consumidor para o segmento de proximidade, impulsionada pela pandemia, com as pessoas comprando perto de casa — diz o presidente do Grupo Nós, Rodrigo Patuzzo.
Vendas por app de ‘delivery’
O Grupo Nós opera também as lojas de conveniência de bandeira Shell Select. A rede firmou parcerias com os principais aplicativos de delivery para vendas on-line e passou a permitir o pagamento com o aplicativo Shell Box, evitando contato físico.
Enriqueceu suas prateleiras com produtos não-perecíveis, itens de higiene pessoal e de limpeza. Hoje, são 1.145 franquias, além de 30 lojas próprias. Até dezembro, Shell Select e Oxxo devem somar 1.350 pontos no Brasil.
Vibra e Lojas Americanas ainda esperam a aprovação do Cade, órgão que fiscaliza a concorrência, para se unirem numa joint venture com investimento de quase R$ 1 bilhão.
As duas já operam no comércio de proximidade e as marcas BR Mania e Local serão preservadas sob o mesmo guarda-chuva. A ideia é crescer em postos, mas também nas ruas. A BR Mania tem 1,2 mil lojas, enquanto a Local, da Americanas, tem 55 nas vias de grandes cidades.
Natália Cid, gerente de franquias da BR Mania, conta que a rede passou a oferecer congelados e produtos de higiene e limpeza quando notou que as compras de passagem foram substituídas pelas de reposição. Na pandemia, introduziu as entregas e pagamentos sem contato.
As vendas caíram 20% em 2020, mas o tíquete médio de compras subiu 10%. A expectativa é encerrar o ano com crescimento e 104 novas unidades:
— Estamos trabalhando com inteligência de dados e identificando as melhores oportunidades. Vamos fechar algumas lojas com desempenho mais baixo — diz Natália.
Com 1,8 mil lojas, a AmPm, maior rede do gênero no país, também passou a oferecer cashback e delivery para fidelizar. E introduziu uma espécie de drive thru digital. O consumidor acessa o catálogo on-line, faz o pedido, paga e retira ou recebe os produtos onde desejar.
— Lojas de rua, shoppings, terminais e condomínios residenciais e comerciais também estão nos planos. Serão 264 novas unidades até 2022 — diz Marcello Farrel, diretor da AmPm na rede Ipiranga.
Praticidade digital
Marcos Gouvêa de Souza diretor-geral da Gouvêa Ecosystem, consultoria com foco em varejo, lembra que, na pandemia, as lojas de conveniência ganharam a concorrência das gigantes do e-commerce, que agregaram alimentos e itens essenciais ao portfólio com entrega em uma hora:
— O conceito de conveniência ganhou novos formatos digitais e entrou na disputa com as lojas físicas pela entrega mais rápida ao consumidor.
Ele aponta a tendência nas lojas autônomas em empresas e condomínios. Sem funcionários, elas ficam disponíveis 24 horas. No Brasil, a novidade foi introduzida pela rede paulista de supermercados Hirota, que desenvolveu o modelo a partir de abril de 2020.
Há duas semanas, a empresa inaugurou a 54ª unidade num residencial da Zona Sul de São Paulo e pretende chegar a 64 até o fim do ano. A moradora Arlene mendes, de 54 anos, foi aprender como comprar sem a ajuda de vendedores:
— Gostei de não precisar sair na rua para fazer as compras.
As pequenas lojas são instaladas em condomínios com até 400 apartamentos e oferecem até 500 produtos, de carvão para a churrasqueira a bebidas. O morador abre a loja com o celular, que lê um QR code, diz Helio Freddi Filho, diretor de expansão do Hirota:
— O cliente entra, faz as compras e paga pelo aplicativo. O funcionário só aparece para limpeza e reabastecer.
Fonte: O Globo