Durante os meses que antecederam a COP26, ocorrida em 2021 em Glasgow, na Escócia, houve grande expectativa para a regulamentação do Artigo 6 do livro de regras do Acordo de Paris, que reconhece que os países podem colaborar de forma voluntária para alcançar suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC). As NDC são os planos de cada país sobre como podem contribuir com o objetivo do Acordo de Paris, de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, visando limitar o aquecimento global.
Na prática, o Artigo 6 coloca a possibilidade de os países participarem do mercado de carbono como estratégia para alcançar suas NDC e define as regras para que isso aconteça. Por isso, as definições do Artigo 6 foram esperadas, tanto por países que viram nessa possibilidade de contribuição uma alternativa a ser considerada nos seus esforços de redução de emissões quanto naqueles que vislumbraram oportunidades de venda de seus eventuais créditos de carbono.
Entre os pontos que precisavam ser definidos nesse artigo estavam a transferência de créditos de carbono entre países e a criação de um mecanismo de mercado de carbono com participação dos setores públicos e privados.
No fim da COP26, finalmente as partes chegaram a um consenso sobre o Artigo 6 equalizando várias questões que eram motivos de preocupação ou resistência de alguns países, por exemplo, a definição de regras para impedir a dupla contagem dos créditos de carbono nas NDC dos países.
Porém, um aspecto que ficou de fora das decisões do Artigo 6 na COP26 foi a possibilidade de os países negociarem os créditos provenientes de emissões de carbono evitadas. Essa decisão deverá ficar para a COP27, no Egito, em 2022, e sua inclusão no Artigo 6 depende de aprovação de uma metodologia específica para esses casos.
Créditos de carbono evitados são aqueles onde são feitas projeções de quanto de carbono poderia ser emitido para a atmosfera caso um determinado projeto não fosse implantado. Este cálculo é feito a partir de uma linha de base, apoiada em dados históricos. Os projetos REDD+ são um importante exemplo deste tipo de crédito de carbono.
O que é REDD+
REDD+ é um mecanismo de redução de emissões de gases de efeito estufa através do desmatamento ou degradação florestal evitada. A implantação dos mecanismos REDD+ se dá através de projetos, realizados por instituições públicas ou privadas, que geram créditos de carbono a partir da conservação de áreas de florestas em qualquer bioma do mundo.
No desenvolvimento deste tipo de projeto é estimada a quantidade de carbono armazenado nas árvores da área de abrangência do projeto e estudada a linha de base, ou seja, o histórico de desmatamento na região. A partir daí é estimado quanto de desmatamento seria evitado com a implantação do projeto e, portanto, quanto de carbono deixaria de ser emitido com a manutenção dessa área de floresta.
Na prática, os projetos REDD+ subsidiam a conservação de áreas de floresta, portanto, além de reter o carbono armazenado nestas áreas, acarretam a conservação da biodiversidade e trazem ganhos sociais para a região.
Questões que envolvem REDD+
Os projetos REDD+ têm um papel importante na conservação da biodiversidade e na remuneração das populações para manter a floresta em pé. Porém, do ponto de vista do enfrentamento ao aquecimento global, é necessário garantir que realmente haja um impacto nas emissões ou absorções de carbono da atmosfera.
A partir desta necessidade é preciso avaliar algumas questões. A primeira é a definição da linha de base, ou seja, de quanto de desmatamento uma área estaria sujeita caso o projeto não fosse implantado. Existem metodologias para a definição dessa linha e elas já são aplicadas nos projetos de REDD+ em andamento, mas existem também incertezas neste processo, que precisam ser bem delineadas e investigadas para que o projeto de fato possa representar um ganho na redução de emissões.
Outro aspecto importante é a adicionalidade. Para que os projetos de compensação de emissões de gases de efeito estufa possam ter impacto na mitigação das mudanças climáticas eles precisam ser adicionais à conservação que já aconteceria sem a sua implantação, por exemplo, aquelas garantidas pela legislação de cada país.
Por isso, para que os projetos REDD+ sejam considerados como atividade com créditos de carbono passíveis de negociação pelos países, no escopo do Artigo 6 estes aspectos precisam ser criteriosamente analisados para que seja adotada uma metodologia adequada, a fim de cumprir os requisitos de transparência, contabilização dos resultados de mitigação, rastreio dos créditos e ajustes correspondentes, previstos no artigo.
Como é feito atualmente
Como as decisões a respeito dos créditos de carbono a partir de emissões evitadas foram adiadas para a COP27, ainda não é possível negociar REDD+ através dos mecanismos definidos no Artigo 6; ou seja, ainda não é possível que países adquiram créditos de carbono provenientes de projetos REDD+ para alcançar suas metas de redução de gases de efeito estufa, declaradas em suas NDC.
No entanto, os projetos REDD+ já são vendidos no mercado voluntário de carbono, onde os desenvolvedores desses projetos podem comercializar seus créditos com compradores, que podem usá-los, por exemplo, para compensar a pegada ecológica de suas atividades econômicas. Assim, em um cenário onde as empresas têm se envolvido cada vez mais na pauta climática, como mostraram em Glasglow, os projetos REDD+ podem ser um mecanismo importante para a conservação das florestas, mesmo agora, onde podem negociar os créditos somente no mercado voluntário.
É necessário apoio financeiro para que as florestas sejam mantidas em pé, a fim de dar suporte às populações locais e às economias dos países responsáveis por essa manutenção, e o REDD+ pode ser um importante mecanismo auxiliar neste sentido.
Fonte: Exame