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Louis Vuitton atendeu pedido do governo francês

Como o grupo dono da Louis Vuitton fez um desinfetante para as mãos em 72h

Toneladas produto serão doados para hospitais

Em um dia normal, a fábrica da LVMH, proprietária da marca Louis Vuitton, nos arredores de Orléans produz frascos de perfume de cores refinadas para sua marca Christian Dior: dourado para J’Adore, roxo intenso para Poison e rosa-bombom para Miss Dior.

Nas primeiras horas da manhã de segunda-feira (16), porém, algo um pouco menos elegante saiu da linha de produção: as primeiras garrafas plásticas de desinfetante para as mãos, destinado ao uso por médicos e enfermeiros nos hospitais de Paris na linha de frente da batalha contra o coronavírus.

O projeto foi elaborado à velocidade da luz, apenas 72 horas depois que o governo francês emitiu um pedido à indústria, na sexta, para ajudar a suprir a falta de importantes suprimentos médicos à medida que a propagação do vírus se acelerava.

Ele mostrou como o bilionário Bernard Arnault, que transformou a LVMH em uma gigante do luxo e maior empresa da França, pode reunir recursos rapidamente e recorrer a redes de influência informais mas poderosas.

Homem usa máscara ao lado de uma loja da Louis Vuitton
Homem usa máscara ao lado de uma loja da Louis Vuitton em Cannes, na França – Eric Gaillard/Reuters

O magnata de 71 anos aprovou o esforço na noite de sábado, em uma breve mensagem de texto ao secretário-geral da LVMH, Marc-Antoine Jamet, que esteve em contato com autoridades e funcionários da saúde internamente durante todo o dia enquanto corriam para obter um lote de testes aprovado. Ela dizia simplesmente: “Excelente!!”

A LVMH está a caminho de doar até o final desta semana 12 toneladas de gel desinfetante para as mãos para os 39 hospitais do sistema de Paris conhecido como APHP. Também aumentará em breve a produção com duas linhas adicionais na fábrica da Givenchy em l’Oise e outra da marca Guerlain, perto de Chartres.

“A LVMH continuará honrando esse compromisso pelo tempo que for necessário”, afirmou a empresa em comunicado.

A medida ocorreu enquanto a França entrava em paralisação na segunda e os casos de coronavírus dobravam a cada 72 horas, com mais de 7.700 pessoas diagnosticadas e 175 mortas até a manhã de quarta. O presidente Emmanuel Macron declarou o país “em guerra”.

Como a LVMH, um amplo conglomerado com 76 empresas em seu portfólio, conseguiu fazer tudo isso tão rapidamente?

Uma razão é a determinação de Arnault. Falando sobre seu chefe, Jamet diz: “Ele o bombardeia com perguntas e depois sai pensando. É uma empresa familiar com um cara no topo que toma decisões muito rapidamente”.

Outro motivo é que a indústria cosmética é na verdade uma prima próxima da farmacêutica, e o equipamento fabril pode ser rapidamente aproveitado para outros fins. O gel desinfetante requer três ingredientes principais —água purificada, etanol e glicerina—, todos os quais a LVMH já possuía.

Além dos perfumes, as fábricas Dior, Givenchy e Guerlain também produzem sabonetes líquidos e cremes hidratantes para as marcas. Esses produtos são similares em viscosidade ao gel desinfetante para as mãos; portanto, a LVMH poderia usar suas máquinas de envase, vasilhames plásticos e dispensadores de pressão. Um tanque alto de metal na fábrica da Dior, geralmente usado para destilar perfume, pôde ser usado para misturar os ingredientes, e uma máquina para encher frascos de sabonete foi recrutada para a embalagem de gel.

Filantropia

A última coisa que ajudou a LVMH a agir rapidamente é que, em uma crise, a França acaba sendo um lugar bem pequeno. O clichê de que a elite empresarial e política se agrupa nos mesmos bairros de Paris, frequenta as mesmas escolas e reuniões sociais existe por uma razão.

“No sistema francês, todos nos conhecemos”, diz Martin Hirsch, médico e funcionário público de alta patente que administra o APHP. “Pode ser inconveniente em tempos normais, mas é ótimo em uma crise.”

Jamet, da LVMH, enviou uma mensagem de texto para Hirsch no último sábado, oferecendo ajuda para fazer gel. Os dois eram amigos há anos e se conheciam desde os tempos da École Nationale d’Administration –instituição de pós-graduação de elite. Hirsch foi imediatamente receptivo à ideia.

A escassez de desinfetante para as mãos ainda não havia surgido nos hospitais que ele supervisionava, mas ele sabia que isso não duraria muito. “Não estávamos totalmente seguros com os estoques de gel e fornecedores que tínhamos, então estávamos realmente analisando se poderíamos fabricar sozinhos”, lembra ele.

Naquela noite, ele enviou seu consultor científico para o centro de pesquisa da LVMH para verificar se a receita seria aprovada pelos órgãos reguladores. A OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda o uso do gel de álcool como alternativa quando não há água e sabão. Os reguladores franceses tinham emitido diretrizes, mas a receita da LVMH era um pouco diferente, por isso teve que ser testada quanto à eficácia e aprovada pelo Ministério da Saúde.

Mais uma vez, a rede da LVMH entrou em ação. Jamet conhecia o ministro da Saúde, Olivier Veran, desde quando os dois trabalharam juntos em um programa da indústria para parar de usar modelos de passarela com índice de massa corporal muito baixo. Ele ligou para seu escritório, e o ministério logo enviou alguém para testar os lotes.

Às 4h de segunda, os trabalhadores da fábrica de perfumes Dior estavam preparados. O diretor da fábrica, Nicolas Ambolet, supervisionava os funcionários quando a linha de produção começou a funcionar. “Toda a nossa equipe está muito orgulhosa de enfrentar o desafio juntos”, afirmou.

Outras empresas francesas também se ofereceram para ajudar, refletindo o que aconteceu na China e na Itália, atingidas pelo surto semanas antes. Na rede APHP, o banco BNP Paribas doou 500 mil máscaras para hospitais de Paris, enquanto a Renault emprestou 300 carros para uso médico.

A L’Oréal disse na quarta-feira (18) que também está reformulando as fábricas das marcas La Roche-Posay e Garnier para produzir milhões de unidades de desinfetante para mãos para casas de repouso e hospitais.

Mas a filantropia corporativa permanece rara em um país dominado pelo Estado, por isso às vezes tem efeito reverso quando os bilionários entram em ação. Arnault e François-Henri Pinault, proprietário da Kering, enfrentaram algumas críticas depois que se comprometeram a doar bilhões de dólares para ajudar na reconstrução da Catedral de Notre-Dame após o incêndio no ano passado.

Desta vez, a caridade da LVMH foi bem recebida. Na noite de terça-feira (17), Romain de Jorna, funcionário do Hospital Saint-Louis, em Paris, tuitou uma foto do frasco do desinfetante para as mãos LVMH: “Obrigado. O produto é magnífico em todos os sentidos da palavra!”

Fonte: https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/03/como-o-grupo-dono-da-louis-vuitton-fez-um-desinfetante-para-as-maos-em-72h.shtml

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