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Varejo reage à isenção a marketplaces

As varejistas brasileiras elevaram o tom contra as plataformas estrangeiras nos últimos dias, e também passaram a cobrar, de forma oficial, ações mais duras de órgãos do governo frente ao risco de novas invasões de produtos asiáticos no país, após a decisão de isentar os marketplaces do imposto de importação.

Dois ofícios sobre o tema foram encaminhados na segunda-feira, pelo Instituto para o Desenvolvimento do Varejo (IDV), aos Correios e à Senacon, secretaria ligada ao Ministério da Justiça, apurou o Valor.

Trata-se de uma reação após inesperada portaria do governo que determinou isenção do imposto de 60% em remessas de até US$ 50, caso as plataformas atendam a condições de um programa de conformidade. O Valor apurou que a isenção foi defendida pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A medida caiu mal entre empresários do varejo como Luiza Trajano (Magazine Luiza), Flávio Rocha (Riachuelo), José Galló (Renner) e Sergio Zimerman (Petz), todos membros do IDV, dizem fontes. A portaria também foi duramente criticada pela indústria têxtil.

Empresários vêm dizendo que a isenção do imposto de importação fere a isonomia tributária, vai afetar empregos e fechar lojas. O IDV publicou nesta terça-feira um comunicado que cita essas questões.

Membros do IDV poderiam acionar o vice-presidente, Geraldo Alckmin, mais próximo ao setor, na tentativa de melhorar o diálogo junto a parte do governo. São quase 900 mil empregos gerados pelos 71 associados do IDV, e receita bruta total de pouco mais de R$ 500 bilhões.

O assunto foi parar em relatórios de analistas de bancos internacionais nesta semana. “Com base em nossas conversas com varejistas e associações varejistas, a resposta do setor não tem precedentes. Praticamente todos os varejistas estão pressionando o governo para reverter a decisão”, escreveu a equipe do Citi, liderada por João Pedro Soares.

O mercado já penaliza papéis de redes que podem ser mais duramente atingidas pela medida, com investidores perdendo dinheiro.

Varejo — Foto: Arte/valor

Varejo — Foto: Arte/valor

Em dois dias, analistas do Bank of America (BofA) e do Citi destacaram os efeitos negativos da isenção em seus relatórios, especialmente para as redes de vestuário, em disputa por mercado com a Shein.

Papéis de C&A, Renner, Riachuelo e Magazine Luiza caíram entre 3% e 8% nesta semana. Desde o dia 30 de junho, quando o Ministério da Fazenda informou sobre a portaria, Magazine Luiza e Renner perdem valor. Ainda há impacto da reforma tributária — parte dela não é bem avaliada pelo setor.

Na segunda-feira, o BofA rebaixou Mercado Livre, Magazine Luiza e Multilaser para “manutenção” do papel e cortou em 70% o preço-alvo da Marisa. “Veremos uma pressão competitiva contínua para os players de fast fashion, especialmente Renner e C&A. Isso porque a principal plataforma estrangeira – ou seja, a plataforma de moda Shein – vem conquistando imenso reconhecimento nos últimos dois anos”, escreveu o Citi.

A portaria de 30 de junho isentará, a partir de agosto, mercadorias importadas de até US$ 50 (quase R$ 250) do imposto de importação de 60% para as empresas que se adequarem a um novo programa de conformidade, o “Remessa Conforme”. Esse programa determina um conjunto de normas a serem seguidas — como envio de dados das remessas antecipadamente aos Correios — pelas empresas estrangeiras.

O governo diz que a ideia é usar essas informações para identificar os fraudadores, melhorar controles e apertar a fiscalização. E o Ministério da Fazenda já se posicionou esclarecendo que haverá uma alíquota intermediária, no lugar da taxa de 60%, e está aberto a ouvir propostas. Ainda defendeu a adoção da isenção como forma de motivar as plataformas a aderirem ao “Remessa Conforme”. O governo preferiu não obrigá-las a aderir.

O Valor já noticiou que está previsto um encontro nesta semana, entre o ministro Fernando Haddad e representantes do varejo, para debater possíveis sugestões de alíquotas, a serem apresentadas pelo IDV.

As plataformas, por sua vez, defendem a isenção como forma de incentivar sua adesão ao programa, já que acreditam que há investimentos a serem feitos para entrar no “Remessa Conforme”.

Uma fonte de uma plataforma estrangeira entende que varejistas brasileiras, por conta do Custo Brasil, têm dificuldade de competir com grupos estrangeiros, mas o “jogo da competição global”, disse ele, vai obrigar o setor a se mexer mais rapidamente para rever o peso da tributação. Na reforma tributária aprovada na semana passada na Câmara o setor ficou fora do tratamento diferenciado para cobrança do IVA.

O Valor apurou que, no ofício do IDV enviado aos Correios, o instituto afirma que cabe à estatal a adoção de mecanismos eficazes de prevenção de importações de remessas fraudadas ou ilícitas, e de ação de fiscalização mais efetiva sobre as remessas quando há indícios de fraude fiscal.

Ainda questiona a estatal a respeito das medidas que ela adotará para garantir que as informações sobre as remessas sejam verdadeiras. Consultores e analistas entendem que os Correios precisariam receber mais investimentos em tecnologia para dar conta do aumento na fiscalização.

Segundo fontes, o IDV pediu aos Correios, com base na lei de acesso à informação, que, em até 20 dias, sejam informados dados sobre operações de importação (“cross border”) nos últimos cinco anos.

Ainda pede informações de eventuais estudos do impacto à estatal da portaria que determina a isenção e do “Remessa Conforme”, e também cópias de contratos de logística da estatal com a empresa de transportes do Alibaba (os Correios tem um contrato com a companhia chinesa há anos) e com outras empresas de logística vinculadas à Shein e Shopee.

O Valor apurou que essa pode ser uma forma de entender melhor dados do contrato com o Alibaba, e eventual existência de conflito de interesses na estatal, já que a entrada de produtos de parceiros vem aumentando a receita anual dos Correios.

Em relação à Senacon, fontes dizem que o ofício encaminhado afirma que a secretaria tem papel importante para garantir proteção de consumidores que podem ser lesados pela compra de produtos piratas ou falsificados, e cabe à secretaria, segundo lei federal, solicitar instalação à Polícia Judiciária, de inquérito policial na hipótese de delitos contra consumidores.

Também pede, utilizando a lei de acesso à informação, que seja informado, ao IDV, sobre a existência de procedimentos administrativos contra as plataformas. E se há alguma atuação conjunta com a Receita Federal para impedir a entrada de remessas irregulares. Se nada foi implementado até agora, pede que sejam abertos procedimentos para investigação.

Segundo três fontes ouvidas pela reportagem nos últimos dias, o presidente Lula apoiou a isenção. Haddad foi contra, mas foi vencido nessa discussão. E decidiu-se atrelar a isenção dos 60% ao “Remessa Conforme”. A ideia de isenção ainda teve apoio da primeira-dama Janja e de Gleisi Hoffmann, presidente do PT, dizem as fontes.

No dia anterior à publicação da portaria da isenção, a Shein e a Coteminas anunciaram, no Palácio do Planalto, mais detalhes de um acordo de produção no Brasil. Josué Gomes, CEO da Coteminas, esteve com Lula antes do anúncio num encontro do Planalto, dizem fontes. Gomes é filho do ex-vice-presidente José Alencar, que esteve na chapa de Lula de 2003 a 2011.

A proposta de isenção não vinha sendo discutida em reuniões que trataram o tema do programa “Remessa” ocorridas em junho, entre o IDV, Lula e Haddad nas semanas anteriores ao anúncio.

Em nota oficial publicada nesta terça-feira, o IDV disse que a decisão do governo de isentar as plataformas causa um “estranhamento”, já que o governo não deveria abrir mão de receita neste momento de busca de equilíbrio fiscal. E afirma que está acionando a Senacon e os Correios e, se necessário, acionará outras entidades para exigir que “todas as obrigações do processo de importação sejam cumpridas”.

Ainda na nota, o instituto diz que, com a isenção dos 60%, as empresas estrangeiras passam a ser tributadas apenas pelo ICMS, de 17%, enquanto as varejistas brasileiras continuarão sujeitas a uma carga fiscal de varia de 80% a 130% da produção à distribuição.

Caso a ideia de uma alíquota intermediária não avance na Fazenda, e fique zerada de forma definitiva, o IDV entende “é essencial que a indústria e o comércio brasileiros sejam tratados com igualdade“, e os benefícios fiscais concedidos às plataformas teriam que ser aplicados também internamente.

Cerca R$ 70 bilhões em tributos deixaram de ser arrecadados ao ano, com o não pagamento de imposto de importação, segundo informação prestada em junho pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin.

“Não mediremos esforços na defesa da igualdade concorrencial, do emprego e do recolhimento de impostos, o que, estranhamente, o governo deveria estar fazendo, e não abrindo mão de receita. Estima-se que o que deixou de ser recolhido aos cofres brasileiros nos últimos cinco anos gire em torno de R$ 137,7 bilhões”, disse o IDV.

Procurados, Correios e Senacon não se manifestaram. A secretaria da Presidência também não comentou as informações apuradas até o fechamento da edição. As empresas Shopee e Shein não comentaram.

Os empresários do setor, ligados ao IDV, não se manifestam sobre as ações da entidade, pois é o instituto que se pronuncia oficialmente.

Fonte: Valor

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