Saída do brasileiro deve dar mais poder a Donald Trump sobre quem vai gerir a entidade de comércio, que vem perdendo relevância em meio à defesa de menor globalização por alguns líderes mundiais
Amadurecida ao longo dos últimos meses, a decisão do diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Roberto Azevêdo, de deixar a instituição multilateral um ano antes do final de seu mandato será anunciada nesta quinta-feira, 14, de acordo com fontes consultadas pelo Estadão/Broadcast na Europa. Procurada pela reportagem, a assessoria do brasileiro disse que ele não se pronunciará sobre o assunto.
A partir das 11 horas de Brasília, no entanto, a Organização se pronunciará sobre o tema, segundo a porta-voz da entidade, Keith Rockwell. “A OMC anunciará esse assunto após a reunião dos chefes de delegação às 16h, pelo horário de Genebra. Até lá, o secretariado da OMC não comentará”, informou a instituição oficialmente.
Reconhecido pelo profissionalismo e com uma grande rede de contatos, Azevêdo já começou a informar os principais embaixadores sobre sua decisão. Ele deixará o posto no início de setembro, um ano antes de terminar seu segundo mandato à frente da OMC.
Apesar de ser bem conceituado, o brasileiro vem enfrentando rusgas com o governo do presidente americano, Donald Trump, que tem colocado uma série de barreiras para que avanços sejam feitos na instituição.
Nos últimos eventos internacionais do qual participou presencialmente, o Estadão/Broadcast identificou que Azevêdo vinha tentando manter um posicionamento otimista em relação a avanços na mudança de estrutura da OMC, mas não conseguia, apesar do discurso positivo, esconder o desânimo com alguma possibilidade real de avanços serem feitos. A discrição sempre foi uma marca do diretor, que é diplomata.
A pandemia foi a “gota d’água que faltava para que o copo transbordasse”, segundo uma fonte, e o diretor chegasse à conclusão de que sua saída da instituição poderia até mesmo abrir caminhos para que ela possa progredir. É sobre esse viés que Azevêdo deve focar a explicação de sua saída.
O surto praticamente estancou o comércio internacional, que já passava por um momento de grande tensão antes do início da doença, com a guerra comercial entre Estados Unidos e China. Azevêdo está no comando da OMC desde 2013, mas a entidade vem perdendo a relevância em meio à defesa de menor globalização por alguns líderes mundiais.
Trump chegou a culpar a Organização por supostamente permitir que a China atuasse de forma desleal em relação ao comércio internacional. Desde o ano passado, o órgão de apelação da OMC está simplesmente paralisado, sem atuar, porque os Estados Unidos barraram a nomeação de novos juízes para substituírem os que se aposentaram. O órgão é o braço mais importante no processo de busca por soluções de controvérsias.
Com a crise do coronavírus, a Organização também se mostrou pouco atuante, apesar de vários governos – inclusive o Brasil – terem tomado decisões de fechar exportações de alguns produtos médico-hospitalares, o que foi de encontro ao pedido de outra entidade que tem sede em Genebra: a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Com a confirmação da decisão de Azevêdo começará todo um trâmite para nomear um substituto, o que pode levar meses. Em princípio, deve ser escolhido um interino para o cargo entre os funcionários que já atuam na instituição.
A saída do brasileiro representará mais poder de Trump sobre quem vai gerir a Organização – e de que forma. Esse é um tema que preocupa um dos interlocutores com os quais o Estadão/Broadcast conversou nesta manhã sobre o tema.