Após extensas negociações prévias e uma assembleia que se prolongou por seis horas e meia nesta terça-feira, a Americanas obteve a aprovação de seu plano de recuperação judicial. A empresa havia solicitado a recuperação judicial em 19 de janeiro, após um déficit de R$ 25,2 bilhões decorrente de fraude contábil e financeira.
A votação registrou o aval de 91,14% dos credores da classe III, representando 97,19% dos créditos, que consistem em dívidas sem garantias. Este grupo inclui bancos e detentores de títulos de dívida, responsáveis por R$ 49,9 bilhões do total da dívida de R$ 50,9 bilhões da varejista, sendo o restante composto por dívidas trabalhistas e com fornecedores.
Com a aprovação, a empresa receberá uma capitalização de R$ 24 bilhões, sendo R$ 12 bilhões provenientes dos acionistas de referência – Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira – e R$ 12 bilhões em conversão de dívida em patrimônio por parte dos credores financeiros, predominantemente bancos, que respaldaram o plano. As novas ações serão emitidas com base em um critério de 1,33 vezes o preço médio ponderado pelo volume de negociação nos últimos 60 dias, resultando em um valor de conversão de R$ 1,30 com a aprovação do plano. Além disso, será oferecido um bônus de subscrição a cada três ações emitidas.
Sem o exercício do direito de preferência pelos acionistas existentes, o trio de referência verá sua participação atual de 30,1% aumentar para 49,3%. Os credores, por sua vez, terão uma fatia de 48,2%. Caso o direito de preferência seja exercido em 10%, Sicupira, Lemann e Telles ficarão com 46% da empresa, enquanto os credores terão 45%.
Os acionistas participantes da capitalização terão um período de lock-up, durante o qual não poderão vender 33% das ações por três anos. Essa restrição será liberada gradualmente em fatias de 6,67% a cada semestre. Quanto ao bônus de subscrição, todo o período de três anos será sujeito a lock-up para 100% da posição.
O trio de acionistas já aportou R$ 1,5 bilhão e comprometeu-se a adiantar mais R$ 3,5 bilhões por meio de financiamentos do tipo DIP (Debtor-in-Possession), montantes que serão deduzidos dos R$ 12 bilhões destinados aos empresários no acordo.
No que diz respeito aos bancos credores, a dívida remanescente após a conversão em ações será abordada de acordo com a opção II de pagamento: R$ 1,87 bilhão será refinanciado por meio da emissão de debêntures, enquanto outros R$ 6,7 bilhões serão recomprados. Os bancos que fornecerem linhas de crédito para a empresa, no valor de até R$ 1,39 bilhão, terão prioridade na recompra e no recebimento do pagamento quando a varejista vender a rede Hortifruti e o grupo de franquias Uni.co.
Os demais credores financeiros, incluindo debenturistas e detentores de títulos, terão a opção de escolher entre receber um desconto de 70% da dívida pelo prazo de 15 anos, corrigido pela TR; aderir à opção II; ou ter a dívida quitada com um deságio de 80% em 20 anos, também corrigido pela TR. A empresa também destinará até R$ 2 bilhões para a recompra de dívida por meio de leilão reverso, com desconto mínimo de 70%.
No tocante aos fornecedores, serão alocados até R$ 3,7 bilhões para pagamento em parcela única, a ser quitada em até 30 dias após a homologação do plano, além de mais R$ 300 milhões para pagamento parcelado em 60 vezes. Adicionalmente, a empresa designará R$ 100 milhões para o pagamento de fornecedores de tecnologia. Em contrapartida, esses fornecedores deverão retomar a revenda de produtos para a empresa, assim como conceder prazos para o pagamento de mercadorias, a fim de melhorar o capital de giro. Serão priorizados os credores com crédito de até R$ 1 milhão, representando mais de 0,30% das vendas da companhia.
O plano da Americanas também contempla a possibilidade de vender as operações de varejo digital e da Ame, instituição de pagamento utilizada no comércio eletrônico. No entanto, a diretora financeira, Camille Faria, afirma que ainda não há uma decisão definitiva sobre esses desinvestimentos e não existe obrigação de vender esses ativos.
O escritório de advocacia Felsberg, representando a Pentágono, agente fiduciário que representa cinco mil investidores detentores de um total de R$ 1,9 bilhões em debêntures, apresentou um agravo contra a decisão que autorizou a realização da assembleia de credores. O escritório alega que o novo plano votado hoje não foi apresentado com 20 dias de antecedência e que a empresa ainda não divulgou os números de 2023. Em novembro, a Americanas reapresentou o balanço de 2022, revelando um déficit contábil de R$ 25,2 bilhões.
A assembleia desta terça-feira foi instalada com um quórum de 97,36% dos credores da classe III. A dívida trabalhista e dos pequenos fornecedores não sofreu alterações nas condições de pagamento, e, portanto, esses credores não participaram da votação. A Americanas já havia acordado com os bancos e a Oliveira Trust, agente fiduciário da 17ª emissão de debêntures da varejista, representando 57% da dívida, excluindo o crédito intercompany, para assegurar a aprovação do plano.
Fonte: Pipeline Valor