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Contra o perigo da história única, mulheres negras querem maior presença nos conselhos de empresas

Em um país no qual mulheres negras representam 28% da população, elas ainda são minoria em cargos de liderança no mercado corporativo. O GLOBO conversou com três executivas que romperam barreiras e se tornaram referências no mundo dos negócios. Além do sucesso profissional, elas compartilham um propósito: apoiar oportunidades para outras mulheres e pessoas negras.

Nina Silva, de 39 anos, nasceu em São Gonçalo (RJ) e desde cedo traçou o objetivo de liderar em grandes empresas. Formada em Administração, iniciou a carreira por meio de um estágio e, a partir dele, cresceu na área de tecnologia. Trabalhou em consultorias internacionais, nas quais acreditava que encontraria mais oportunidades do que em empresas brasileiras. Ainda assim, não teve o mesmo reconhecimento financeiro e social de outros colegas.

— Era questionada sobre os resultados, interrompida, algumas vezes boicotada pelo meu time. Eu gerenciava a partir de um sistema alemão, e ouvia: “Por que não foi para a Alemanha casar com gringo?”. Não tinha autonomia para contratar pessoas diversas ou treiná-las. Me deparei com a falsa escalada, porque estava em cargos de poder mas não o exercia.

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Presença em conselhos
Nina enfrentou um burn out, saiu do emprego e cogitou deixar a área de tecnologia. Mas, em 2017, conheceu seu atual sócio, Alan Soares, e juntos fundaram o Movimento Black Money, no qual é CEO. Trata-se de uma plataforma de inovação digital para autonomia da população negra, que reúne iniciativas como serviços financeiros, cursos, um marketplace, programas de inclusão para empresas e um projeto social. Desde então, foram muitos reconhecimentos, entre eles o de Mulher Mais Disruptiva do Mundo, pelo Women in Tech Global Awards 2021.

— Minhas principais conquistas são ver minha família falar de letramento racial, ter meu próprio negócio e impactar de maneira social — afirma a executiva, que segue envolvida em iniciativas de impacto, a mais recente dedicada à inserção feminina no mercado de NFT, o Project EVE.

Nina, que é conselheira voluntária na ONG United Way, na Fiesp, no Tribunal de Contas da União e na startup Lady Driver, busca ingressar em conselhos de grandes empresas, mas acredita que existe um “tabu” nesses convites. É nessa frente que atua Jandaraci Araujo, 49 anos, uma das fundadoras do Conselheira 101, programa de incentivo à participação de mulheres negras em conselhos de administração, por meio de formação e fortalecimento de networking.

Jandaraci é CFO na 99Jobs e conselheira na Kunumi, no Instituto Capitalismo Consciente Brasil e no Instituto Tomie Ohtake (neste último, como voluntária). Nasceu em Salvador, mas sua história profissional começou no Rio. Mãe de duas meninas, vendia salgados na frente de uma universidade quando um dos professores que também era executivo em uma rede de varejo ofereceu a primeira oportunidade de estágio.

— Oportunidade e preparação foram pontos fundamentais para a minha história. Mas a qualificação não me eximiu de passar por situações racistas e machistas. Em processo seletivo, ao ganhar menos ou em feedbacks mais duros. Minhas filhas foram minhas grandes catalisadoras em muitos momentos, porque eu não tinha a opção de desistir — afirma a executiva, que celebra também as realizações delas: uma advogada e uma fisioterapeuta.

Jandaraci ainda quer ser conselheira em uma empresa listada na bolsa de valores e presidente de conselho. Também sonha com o dia em que será habitual ter mulheres negras em cargos de liderança.

— Não acredito em histórias únicas, elas não transformam. Não adianta nada você chegar ao “pódio” sozinha. É muito importante podermos nos ver nesses lugares. Se você não dá oportunidade para outra, então é um propósito vazio.

Empoderar mulheres negras também é prioridade para Rachel Maia, de 51 anos. Nascida na periferia de São Paulo, caçula entre sete irmãos, iniciou a carreira como controller e se tornou CFO e CEO de companhias como as joalherias Tiffany & Co e Pandora e a grife de moda Lacoste. A trajetória é contada em seu livro “Meu caminho até a cadeira número 1”.

— Eu não tinha uma visão do topo, mas à medida que um conhecimento não me bastava, buscava o próximo degrau. Sempre tive cuidado em me planejar, tendo a resiliência como característica máxima. É uma conquista ter furado essa bolha, ter sido presidente de empresas globais, me tornado conselheira e mãe. Não vou dizer que terminaram, quero muito mais. Para isso é necessário estar sempre se aprimorando — afirma a executiva, que quer trabalhar mais na área de sustentabilidade.

Mais oportunidades
Rachel atualmente é conselheira de Vale, CVC Corp, Grupo Soma e Banco do Brasil, além de presidente do conselho consultivo do UNICEF Brasil. Criou o Instituto Capacita-me, que realiza parcerias com empresas que queiram oferecer oportunidades a talentos das periferias, e é fundadora e CEO da RM Consulting, na qual atua em segmentos como letramento de lideranças, censo de diversidade para empresas e recrutamento voltado para diversidade e inclusão. Além disso, oferece mentorias para apoiar mulheres negras:

— Mais do que nunca, temos que cobrar as empresas de crescer metas de representatividade. Só assim vamos combater o racismo, o machismo e a lgbtfobia. — afirma. — Nas mentorias, acho imprescindível não só mostrar o exemplo, mas dialogar. Provoco essas mulheres ao dizer que elas têm qualificação, mas precisam ficar atentas e buscar bater em portas, muitas vezes quando não estão abertas. Por isso eu digo: dê a oportunidade que te mostro o sucesso.

Fonte: Revista PEGN

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