Na esteira da sua estratégia para acalmar os ânimos do mercado e, ao mesmo tempo, acenar para o eleitorado de 2022, o governo prepara um mega pacote de medidas, que deve incluir desde um novo programa de renda básica, até marcos legais e gatilhos para destravar o Orçamento.
Apesar de receber de forma positiva a parte ligada à questão orçamentária, economistas de mercado temem que o plano tire o foco da atual gestão no ajuste fiscal e acabe dando início a uma nova fase de gastança pública, como aconteceu nos últimos anos do governo Dilma.
A semana já começou com sinais negativos sobre esse assunto. O anúncio estava sendo esperado para esta terça-feira, 25, porém, pode ser adiado, segundo fontes próximas ao ministo da Economia, , ouvidas pelo jornal O Globo, porque algumas medidas ainda não estão prontas.
“Vejo vários planos com nome verde amarelo, num tom nacionalista. O problema é que vários deles significam aumento de gastos e elevam as preocupações com a questão fiscal nos próximos anos”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.
Vale se refere aos dois principais planos do pacote para o governo: o Renda Brasil, um sibstituto mais amplo do Bolsa Família, e o Casa Verde Amarela, programa de habitação que prevê juros reduzidos para a compra de imóveis, aos modes do Minha Casa Minha Vida, criado durante a gestão petista.
O que mais interessa ao mercado, porém, parece ficar em segundo plano: “O pacto federativo e a reforma administrativa, que deveriam ser o grande foco, já não vejo indo para frente”, diz Vale.
Ambos ajudariam o governo a abrir espaço no Orçamento — que tem 95% das despesas vinculadas a despesas obrigatórias —, para reduzir a dívida federal, além de permitir mair gastos como obras de infraestrutura e outros tipos de investimentos.
Por ora, Guedes espera incluir três medidas de ajuste fiscal no pacote: uma para desvincular receitas restritas a fins específicos, outro para frear a expansão das despesas obrigatórias com um gatilho que congela salários de servidores, e a extinção de fundos públicos. Todas já haviam sido apresentadas no ano passado ao Congresso, mas não foram para frente.
Agora, a avaliação é que o apelo entre os parlamentares pelo ajuste fiscal é maior: “Me parece que os gatilhos podem ser aprovados no Congresso, porque virou uma pauta positiva perante a população e entre os próprios parlamentares, que vão poder capitalizar com isso também durante a campanha das eleições municipais”, diz Paloma Brum, economista da Toro.
A avaliação de Brum também traz o temor sobre a questão fiscal: “Existe espaço dentro do teto? Sim. O receio do mercado, porém, é que a gente possa bater esse teto no ano que vem ou 2022”, diz.
Criado em 2017, o teto de gastos é uma regra constitucional que prevê que o orçamento do ano só pode considerar a quantia do ano anterior somada da variação da inflação. Desde o ano passado, economistas alertam para a necessidade de rever as regras ou liberar espaço no orçamento.
Nesse sentido, os gatilhos serviriam para congelar gastos com salário de servidores, por exemplo, quando o uso do orçamento bater em um determinado nível, o que daria mais fôlego financeiro ao governo. Essa ideia, porém, ainda deve encontrar resistência no Senado, onde a tramitação vai exigir mais estratégia e capital político do governo, segundo Arthur Mota, economista da Exame Research:
“O Congresso emitiu um sinal ruim na semana passada, colocou um desafio apenas para o reajuste de salário, imagina agora a redução proporcional”, diz.
Anunciado primeiro em abril, mas com foco em infraestrutura, o Pró-Brasil causou desentendimentos entre Guedes e o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, que defende a ampliação de obras públicas como motor da retomada pós-pandemia. Para agradar a gregos e troianos, o projeto final deve ser um mix das demandas dos dois lados dessa discussão.
“Esse ‘empacotamento’ num plano é bem clássico do Brasil, com o governo lançando planos grandes de uma vez só e tentando angariar capital político em cima deles, com apoio da sociedade”, diz Mota.
Na avaliação de Vale, é uma pauta muito ambiciosa para um semestre que promete ser conturbado, em função da discussão ainda indefinida sobre o orçamento do ano que vem, das eleições minicipais e da troca dos presidentes da Câmara e do Senado: “Pauta muito ambiciosa para semestre apertado, parece não se conseguir avançar como se deveria”, diz.
As tensões no mercado financeiro com a respeito do cenário fiscal cresceram após o que Guedes chamou de uma “debandada” da equipe econômica, com a saída de Salim Mattar (privatizações) e Paulo Uebel (Desburocratização), ha duas semanas, levando para seis o número de baixas da pasta.
O movimento foi sucedido pelo aumento das cobranças públicas do ministro por um apoio presidencial à manutenção do teto de gastos. O problema é que esse suporte por parte do presidente veio, mas de maneira dúbia, diz a gestora BlueLine:
“A falta de convicção do presidente na agenda liberal do ministro, a baixa probabilidade de uma guinada significativa na direção de uma agenda de reformas e a ausência de saídas para o abismo fiscal que nos espera à frente, nos fazem reduzir a confiança nos fundamentos econômicos do Brasil”.
Fonte: Exame