Interação, que inclui possibilidade de adoção, é atrativo, mas gastronomia sustenta os negócios
Nos últimos meses, cidades brasileiras ganharam seus primeiros cat cafés, onde os clientes podem brincar com gatos e também adotá-los. Novidade no país, os negócios têm atraído amantes de felinos e curiosos.
Mariana Eduarda Brod, 31, não estava preparada para receber tanta gente quando inaugurou o Betina Cat Café no início de julho, em Brasília. Começou com apenas quatro mesas e, duas semanas depois, já precisou aumentar para 12.
O mesmo aconteceu com o Gatcha, que abriu as portas em junho, no centro de São Paulo. “Eu pensei o negócio para ser pequenininho, não imaginei que fosse virar essa febre, com fila para fora da loja”, diz o dono, Lucas Rosa, 31.
O conceito de café cat não é novo: surgiu em 1998 em Taiwan e popularizou-se no Japão. No Brasil, chegou em 2014, com o Café com Gato, em Sorocaba (SP). Mas só nos últimos dois anos ganhou mais força, com a inauguração do Gato Café, no Rio, em 2020.
Um fator que dificultou a vinda do modelo para cá foi a legislação sanitária brasileira, que proíbe que animais fiquem no mesmo local onde alimentos são servidos. A solução foi criar um ambiente separado da cafeteria para abrigar os bichanos.
Para acessar o espaço, os clientes pagam uma taxa, que ajuda a bancar o custo de manutenção dos felinos —inclui ração, areia e funcionários dedicados a cuidar deles. Resgatados por ONGs, os animais ficam disponíveis para adoção.
No Gatcha, o cliente precisa agendar presencialmente um horário para entrar numa área com até oito gatos. Ele paga R$ 15 por 15 minutos ou R$ 25 por 30 minutos. O estabelecimento também é especializado em matchá, chá verde em pó usado como base para a preparação de doces e bebidas quentes e geladas.
Lucas, que é músico, nunca tinha pensado em empreender. Conheceu um cat café em 2016, quando morou em Nova York, e desde então esperava que alguém levasse o modelo para a capital paulista.
Até que, em janeiro, viu que ele mesmo poderia pôr a ideia em prática. Procurou ajuda do Sebrae, alugou uma loja e investiu todo o dinheiro que tinha guardado. “Montei o lugar que adoraria frequentar”, diz.
As irmãs Bruna, 25, e Luana Paroni, 29, poderiam ter aberto o seu cat café em São Paulo antes de Lucas, não fosse a pandemia. Elas chegaram a alugar um imóvel em março de 2020, mas logo tiveram que desistir da empreitada. “Doeu muito na gente, mas agora percebemos que esse tempo foi importante para reestruturar o projeto”, diz Bruna.
As duas inauguraram a Gateria no fim de julho, em uma casa na Vila Mariana (zona sul), depois de cinco meses de reforma. Na frente do imóvel, há um espaço pet-friendly, no qual cães também são bem-vindos. Depois, vem o ambiente da cafeteria e, nos fundos, fica o lugar destinado aos felinos, que tem 120 m² e pode abrigar até 18 animais.
A área tem mobiliário projetado para eles, fontes de água e até um teto retrátil. Por vez, é permitida a entrada de até 15 pessoas, que pagam R$ 16,90 por 30 minutos de visitação. Há várias regras, como não fazer barulho nem pegar os gatos no colo, a não ser que eles tomem a iniciativa. Quem quiser adotar um gatinho deixa seu contato com o monitor do espaço, que encaminha a solicitação à ONG Aprogato, responsável pelo processo.
A ONG, inclusive, só manda para o café gatos considerados sociáveis, que têm condições de interagir com as pessoas.
A interação com os felinos e o apoio à causa animal são o principal fator de atração de clientes, mas a cafeteria é o que de fato sustenta o negócio. “Ter uma boa comida e um bom café sempre foi uma grande preocupação nossa”, diz Luana. Sem experiência, as irmãs contrataram a consultoria de um barista especializado em cafés especiais.
Mariana, dona do Betina Cat Café, em Brasília, sentiu a necessidade de recorrer a um serviço do tipo após alguns dias de funcionamento. “Vi que não é porque somos especialistas em gato que não podemos ser também em café”, diz. A ideia agora é ampliar o cardápio para fidelizar os fregueses a longo prazo.
A empreendedora também quase abriu o negócio em 2020, mas adiou a ideia por causa da pandemia. O nome Betina é uma homenagem a uma gata paraplégica adotada por ela. No espaço, Mariana montou ainda uma loja com itens para gatos e para humanos apaixonados por eles.
Sobretudo no fim de semana, há fila para visitar a área dos felinos, que comporta seis pessoas por vez. Com isso, foi preciso estabelecer o limite de dez minutos de permanência, com valor de R$ 10 (quando dá para liberar mais tempo, é cobrado R$ 1 por minuto).
Como os gatos costumam dormir de manhã, a cafeteria funciona das 14h às 22h. Durante o dia, há quatro intervalos para que os animais descansem, e as sessões podem ser interrompidas a qualquer momento caso eles fiquem cansados ou estressados.
“Eu poderia ganhar mais dinheiro, mas aqui os gatos são prioridade”, diz Mariana. Ela espera ter o retorno do seu investimento em até um ano e já e negociando a abertura de uma segunda unidade em outra cidade do Centro-Oeste.
Para Alexandre Cymes, consultor de negócios em gastronomia, é preciso ter muita cautela ao investir no segmento de cat cafés. “Neste momento, há bastante gente curiosa para visitar esses lugares. Mas e daqui um ano? O empreendedor deve ter estratégias para deixar o negócio sempre atualizado e atrativo.”
Segundo o especialista, quanto menor for a cidade, menor é também a chance de o empreendimento dar certo. “É uma cafeteria que atende a um nicho. Não existe espaço para uma febre de cat cafés.”
Fonte: Folha