Na virada dos anos 2000, a cadeia global de fast food apostou em novos negócios. Anos depois, saiu de tudo para focar na marca principal. Será que agora a diversificação vai dar certo?
Na semana em que divulgou seu plano de inaugurar 10.000 lojas até 2027, a famosa rede global de fast-food McDonald’s também apresentou um novo conceito de restaurantes dentro de sua estrutura.
Esta é uma notícia significativa para uma empresa presente em 120 países, com uma base diária de 68 milhões de consumidores, tudo isso sob a mesma marca e um cardápio com adaptações regionais.
O novo empreendimento é chamado de CosMc’s, uma cafeteria com uma temática sideral que presta homenagem ao alienígena CosMc, um personagem utilizado pela rede em comerciais nas décadas de 80 e 90.
A cafeteria temática está atualmente em fase de teste em uma unidade no estado de Illinois, nos Estados Unidos, próxima à sede global da empresa em Chicago. Segundo a companhia, o formato está previsto para ser expandido com 10 unidades até 2024, todas nos Estados Unidos.
O histórico de investimentos do McDonald’s
A aposta atual do McDonald’s retoma a estratégia de diversificação da empresa além da conhecida lanchonete dos arcos dourados, avaliada em 104 bilhões de dólares.
No início dos anos 2000, a McDonald’s global buscou expandir seus negócios através da aquisição de participações em três outras empresas de comida rápida: Donatos Pizza, Boston Market (dona da marca Boston Chicken) e a então pequena rede de comida mexicana Chipotle.
Esse período coincidiu com uma fase desafiadora para a rede, enfrentando críticas aos serviços, queda nas vendas e margens apertadas devido à concorrência com marcas como Burger King e Wendy’s. No entanto, esses investimentos anteriores não foram bem-sucedidos por diferentes razões.
No caso da Donatos, uma rede de pizzarias em Columbus, Ohio, um plano de expansão muito rápido trouxe franqueados sem experiência no negócio de pizza, resultando em problemas com a escolha de pontos comerciais e uma flutuação no número de unidades.
Quando o McDonald’s adquiriu a Donatos em 1999, havia 143 unidades. Em poucos meses, a rede cresceu para 220 unidades, mas com desempenho insatisfatório, o McDonald’s vendeu o controle de volta ao fundador em 2002. A rede foi enxugada para 180 unidades na época da venda, e hoje conta com 154 unidades.
A situação da Boston Market, uma rede de restaurantes especializados em carnes típicas de rotisserias, como frango assado, representou um descompasso de expectativas ainda maior. Quando o McDonald’s investiu na empresa em 1998, analistas questionaram as sinergias entre uma rede de fast food e uma de restaurantes com serviço de mesa, como era o caso da Boston Market.
Houve especulações de que o McDonald’s estava interessado apenas nos pontos comerciais da Boston Market. As operações das duas empresas permaneceram separadas por sete anos, até que o McDonald’s vendeu a Boston Market para um fundo de private equity em 2007.
O investimento na Chipotle ocorreu em 1998 e impulsionou a rede de comida mexicana de 14 unidades para 500 em sete anos. No entanto, em 2006, o McDonald’s vendeu toda a sua participação na Chipotle. Atualmente, a Chipotle possui mais de 1.400 lojas e é conhecida por sua variedade de burritos.
Cristina Souza, CEO da consultoria Gouvea Foodservice, comenta sobre o desafio de trazer negócios específicos para uma estrutura tão grande, destacando que a máquina principal pode atrapalhar o desenvolvimento das outras marcas.
Diferentemente das iniciativas anteriores, o McDonald’s está lançando o CosMc do zero, possibilitando explorar mais sinergias.
Sérgio Molinari, professor de food service da ESPM, destaca duas vantagens operacionais: as sinergias logísticas de uma rede com 40 mil lojas no mundo e a capacidade de transitar produtos entre as duas marcas.
A aposta no café agora
Por que o McDonald’s, conhecido por manter o foco em seu negócio principal, decide investir tempo e energia em um novo mercado? A resposta está na estratégia de competir com a gigante do setor, a Starbucks, tornando o lançamento de uma nova marca a opção mais viável.
A chegada da nova marca visa capitalizar algumas tendências, como o crescente interesse em torno do café, um setor em transformação nos últimos anos e com projeções de expansão acelerada.
Globalmente, o mercado global de cafés para foodservice deve movimentar mais de 478,85 bilhões de dólares até o final do ano, com projeções de ultrapassar 729 bilhões de dólares em 2030, um aumento de mais de 50% em relação ao valor atual.
Mais de 60% dos americanos consomem pelo menos uma xícara de café por dia. Outro ponto estratégico é o apelo à geração de experiências, permitindo aos consumidores personalizar suas bebidas com xaropes diversos, doses energéticas ou de vitamina C, além de desfrutar de itens vibrantes e coloridos.
O cardápio da nova marca inclui uma variedade de opções, como Churro Frappe, sanduíches, chás gelados e limonadas, com a proposta de lojas menores, estímulo à compra digital e pelo drive-thru.
Sérgio Molinari destaca que a escolha de uma nova marca visa expandir a rede através de uma especialidade adicional e de um formato diferente, conquistando um público que o McDonald’s precisa cuidar para evitar a perda de interesse na marca principal.
Ele menciona que o McCafé, lançado há cerca de 30 anos, poderia ter desempenhado esse papel, mas acabou ficando limitado às lojas do McDonald’s, não conseguindo desenvolver uma identidade própria.
Empresas que diversificaram com sucesso
Outras redes de fast food já trilharam o caminho da diversificação com sucesso. Na década de 1970, a Pepsico entrou no mercado de restaurantes ao adquirir a Pizza Hut, seguida pelo Taco Bell e KFC na década seguinte. Em 1997, a empresa fez um spin-off da operação, criando a Yum Brands, controladora de negócios que movimentam quase 7 bilhões de dólares por ano.
A Yum Brands expandiu suas redes para territórios como o chinês, utilizando apelo pop e destacando os valores da cultura ocidental. Nos últimos anos, implementou estratégias como entregas rápidas para a Pizza Hut e modelos de quiosques para o Taco Bell, impulsionando os negócios.
Outro exemplo é a RBI (Restaurant Brands International), formada em 2014 pela fusão do Burger King com a Tim Hortons, uma rede canadense de cafés. Em 2017, a rede de restaurantes de frango frito Popeyes entrou para o grupo.
A RBI atua como gestora de marcas, investindo na expansão internacional das subsidiárias e explorando novas ocasiões de consumo, como tarde e noite, lançando bebidas geladas e ampliando as ações de marketing.
Fonte: Exame