Mesmo que você não dirija, é fácil saber o que representa o sinal verde: é hora de acelerar e seguir seu caminho. Para a Fórmula 1, mais do que nunca, a cor significa o lema mais importante para sua meta dos próximos anos, depois de sobreviver em 2020 ao momento mais difícil de sua história. Para a principal categoria do automobilismo mundial, o verde será mesmo o caminho, de acordo com o plano de se tornar totalmente sustentável até, no máximo, 2030.
Criada no mundo pós-guerra em 1950, a Fórmula 1 nunca teve sua história interrompida. Mais do que isso: ano após ano, seu crescimento era quase exponencial em termos de audiência, relevância global e, claro, milhões de dólares em contratos. Até que veio a pandemia em 2020 e seu primeiro grande impacto global foi o cancelamento da etapa de abertura daquela temporada, prevista para Melbourne. Todos os pilotos, as equipes e a mídia do mundo inteiro estavam lá em Albert Park prontos para acelerar, mas o que todos viram foi o vermelho da interrupção.
Pior: vieram os três meses mais críticos da história da F1, com contratos cancelados, prejuízos milionários, incertezas e muita gente duvidando que um evento global, que viaja por 20 países ao longo do ano, conseguiria sobreviver em meio a tantas restrições. Ficaram pelo caminho desde GPs tradicionais, como o de Mônaco, até os novatos, como o do Vietnã.
Parece incrível, mas um ano depois de atingir seu ponto mais baixo, a Fórmula 1 acaba de finalizar em 2021 sua maior temporada da história, com 23 provas e novas praças, como um circuito de rua em Miami, nos Estados Unidos, onde o último grande mercado global parece ter sido finalmente conquistado. A prova em Austin, no final de outubro, bateu recorde de público, com mais de 400.000 espectadores, considerado o maior da história da categoria (mesmo levando em conta outros circuitos tradicionais) e, possivelmente, o maior público esportivo do mundo pós-pandemia.
Um problema recorrente para a audiência era o domínio de uma única equipe ou piloto, o que tornava as corridas entediantes ou previsíveis demais. Pois 2021 viu a ascensão da Red Bull como força capaz de acabar com a sequência de vitórias da Mercedes. E, como num roteiro de cinema, opondo dois pilotos fora das pistas.
De um lado, o maior recordista de todos os tempos, Lewis Hamilton, com mais de 100 poles e vitórias e a conquista de sete títulos mundiais, o que já o coloca como o melhor de toda a história em termos estatísticos. Engajado, o piloto da Mercedes defende as causas ambientais e a inclusão social e combate o preconceito racial divulgando causas ambientais e o Black Lives Matter, por exemplo.
De outro, o mais jovem campeão da história da Fórmula 1, Max Verstappen. Depois de vencer com apenas 18 anos seu primeiro GP como piloto da Red Bull, no circuito de Barcelona, em 2016, o holandês de estilo playboy fora das pistas agora busca seu primeiro título, brigando curva a curva com Hamilton. Essa disputa explosiva já rendeu polêmicos acidentes que fizeram a mídia e o público lembrarem as famosas rivalidades de outros tempos áureos da F1, como Niki Lauda vs. James Hunt, nos anos 1970, ou Ayrton Senna vs. Alain Prost, nos anos 1980.
O desenlace da atual rivalidade entre Hamilton e Verstappen provavelmente só acontecerá ao final da temporada, no dia 12 de dezembro, em Abu Dabi. A pandemia, quem diria, também ajudou a categoria a ampliar seu novo produto para engajar os fãs: o seriado Drive to Survive, da Netflix, grande responsável por popularizar o esporte entre os mais jovens e em mercados que não tinham tanta tradição no esporte, como os Estados Unidos, sede da atual dona da Fórmula 1, a Liberty Media.
Com o mundo congelado em termos esportivos de março a julho de 2020, a série trouxe visibilidade para a Fórmula 1 em uma época em que as atenções ficaram nas telas, seja da TV, seja dos tablets, seja dos celulares. Quando a ação na pista voltou, o embate Hamilton vs. Verstappen trouxe a emoção dos grandes duelos.
O desafio, porém, ainda existe no curto e médio prazo: pilotos e equipes concordam que a categoria precisa ser mais verde, mais democrática e menos elitista. Um plano ambicioso, batizado de F1 Net Zero Carbon, prevê uma categoria totalmente sustentável até 2030. Elaborado após 12 meses de intensos estudos feitos pela FIA e por especialistas em sustentabilidade, equipes, promotores e parceiros, o projeto prevê novas regras de motores e combustíveis renováveis, pensando em atrair mais equipes e montadoras, como a Volkswagen. Desde 2014, a categoria tem evoluído bastante nas unidades de potência híbridas, mas o objetivo é conseguir desenvolver um motor — não necessariamente elétrico — que não emita carbono.
“Ao longo de seus 70 anos de história, a Fórmula 1 foi pioneira em numerosas tecnologias e inovações que contribuíram positivamente para a sociedade e ajudaram a combater as emissões de carbono. Da aerodinâmica inovadora ao design dos freios, o progresso liderado pelas equipes da F1 beneficiou centenas de milhões de carros de passeio”, afirma Chase Carey, CEO da Fórmula 1. A revolução verde ficou ainda mais importante para a categoria depois que a Fórmula E sofreu o impacto da saída de diversas montadoras, como Porsche, Mercedes e Audi. Houve quem apostasse que a categoria de carros elétricos poderia fazer frente à Fórmula 1 no futuro, mas a Fórmula E, ainda jovem, sofreu muito mais os impactos financeiros da pandemia.
Agora é mais provável que a Fórmula 1 encontre de fato a melhor tecnologia para seguir sendo o esporte mais rápido do mundo, mas da forma mais ecológica e equilibrada possível. Mais do que nunca, a luz verde para a F1 é sinal para acelerar — rumo ao caminho da sustentabilidade e fazendo do esporte mais inclusivo do que nunca.
Fonte: Exame