Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, afirmou recentemente que a instituição está buscando “condições estruturais” para a redução da taxa de juros do país. Enquanto isso, governistas e críticos estão argumentando que a política monetária atual está prejudicando a economia.
Apesar da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) em maio de manter a taxa básica de juros em 13,75% ao ano, o debate sobre a Selic continuou em alta no início do mês. Membros do governo federal criticaram a diretoria do Banco Central pela decisão, enquanto economistas apresentaram argumentos tanto a favor como contra a redução da taxa de juros.
Os que concordam com o governo afirmam que a economia já apresenta sinais suficientes de desaceleração para que o BC seja mais flexível com relação aos juros. Por outro lado, aqueles que discordam apontam para indicadores importantes de inflação acima das expectativas, tanto no Brasil como no exterior, o que mantém o BC relutante em reduzir as taxas neste momento. Por fim, há aqueles que estão cautelosos, mas acreditam que haverá uma suavização dos juros em breve.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lidera a investida do governo para reduzir a taxa de juros. Durante um evento para celebrar o Dia do Trabalhador, na segunda-feira (1º), ele associou o nível atual da Selic ao desemprego, afirmando que a taxa de juros é parcialmente responsável pela situação do país.
“A gente não poder viver mais em um país aonde a taxa de juros não controla a inflação, ela controla, na verdade, o desemprego nesse país porque ela é responsável por uma parte da situação que nós vivemos hoje”, disse.
Essa foi apenas mais uma crítica pública feita pelo presidente Lula desde que assumiu a Presidência pela terceira vez. No entanto, mais uma vez, a ofensiva não teve efeito sobre a diretoria do Banco Central, liderada por Roberto Campos Neto.
Em comunicado divulgado na noite de quarta-feira (3), o Copom não apenas manteve a taxa de juros inalterada, mas também sinalizou que poderá retomar o ciclo de ajuste caso seja necessário.
“O Comitê avalia que a conjuntura demanda paciência e serenidade na condução da política monetária. O Copom enfatiza que, apesar de ser um cenário menos provável, não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”, disse o texto.
Isso indica que o Banco Central pode voltar a aumentar a taxa de juros em outro momento, se necessário. No entanto, desta vez, o próprio Copom reconhece que esse é um cenário menos provável, diferentemente do comunicado anterior.
Dias antes, Roberto Campos Neto reconheceu as medidas realizadas pelo governo para melhorar o ambiente econômico, mas afirmou que o Banco Central ainda está procurando fundamentos técnicos para iniciar o ciclo de redução da taxa de juros.
“Nenhum banqueiro central gosta de aumentar juros (…). Então, obviamente, queremos encontrar as condições estruturais para que isso [redução de juros] aconteça”, disse Campos Neto durante um evento no dia 21.
O Banco Central está aguardando condições estruturais para reduzir as taxas de juros, de acordo com o seu presidente Roberto Campos Neto. O governo e os críticos argumentam que o efeito da política monetária está prejudicando a economia, mas o Banco Central mantém firme sua posição.
Em seu comunicado mais recente, o Comitê de Política Monetária (Copom) manteve a taxa de juros inalterada e sinalizou que pode retomar seu ciclo de aperto se necessário. No entanto, também reconheceu que este cenário é menos provável do que antes.
Campos Neto delineou três critérios que o Banco Central considera em suas decisões de política monetária: expectativas de inflação, hiato do produto e inflação atual. Ele acredita que a incerteza sobre a política fiscal e a possibilidade de mudança da meta de inflação pioraram as expectativas de inflação até 2026.
O Banco Central está esperando que medidas práticas sejam tomadas para melhorar as finanças públicas e esclarecer a meta de inflação antes de prosseguir com a redução das taxas de juros. O governo acredita que o envio do arcabouço fiscal ao Congresso e o anúncio de medidas de aumento de receita devem ser suficientes para sinalizar uma redução das taxas de juros. No entanto, o Banco Central quer ver esses planos sendo implementados primeiro e espera que isso leve a uma melhor perspectiva de taxas de juros a longo prazo e expectativas de inflação mais baixas, criando mais espaço para reduzir as taxas de juros sem ter que voltar atrás.
“O mandato do Banco Central é entregar a inflação na meta. Se a inflação projetada não está na meta, não está na hora de cortar o juro”, diz Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica para América Latina do Goldman Sachs.
A visão de Ramos coincide com os argumentos do BC, que apesar dos obstáculos macroeconômicos, têm visto resultados positivos na atividade econômica e estímulos fiscais elevados. Um exemplo disso é a prévia do PIB de fevereiro, que apresentou um forte crescimento de 3,32%, após uma estagnação em janeiro. Ramos destaca medidas como o reforço ao Bolsa Família, o aumento do salário mínimo e o piso da enfermagem como incentivos que têm impulsionado a economia, em contraste com as altas taxas de juros. Ele argumenta que o hiato de produto não está tão aberto e o nível de ociosidade tem diminuído.
Por outro lado, a crítica
Em sentido oposto, o economista André Roncaglia menciona os dados de desemprego do país e o episódio da paralisação de montadoras de automóveis como evidências de desaceleração econômica e ociosidade industrial.
A taxa de desemprego do país aumentou para 8,8% no primeiro trimestre de 2023. Os juros geralmente afetam a empregabilidade, pois podem influenciar a decisão dos empresários sobre cortar investimentos e projetos de expansão de suas empresas.
A questão das montadoras é um exemplo da restrição de crédito na economia. Com preços em alta e financiamentos mais caros, a demanda por veículos novos diminui.
“Há muitos exemplos de desaceleração, e esse é o ponto central da crítica: ninguém está falando para o BC jogar os juros a 2% ao ano”, afirma Roncaglia.
O economista também aponta um desconforto com toda a comunicação do Banco Central sobre a questão. Roncaglia afirma que Campos Neto torna mais difícil a acomodação da questão da taxa de juros por passar sinais dúbios.
“O primeiro fato é a mudança do indicador de relevância de acordo com a plateia ou a evolução da conjuntura. Até algum tempo atrás, era a inflação que estava em nível muito elevado. Agora, mudou para expectativas que não estão ancoradas”, diz.
“Ele vai migrando os indicadores, à medida em que o argumento que ele usa vai perdendo força.”
Para o economista, a autonomia do Banco Central, lei aprovada para que o presidente da instituição possa tomar as decisões sem influência política, permite independência operacional ao BC, mas Campos Neto deveria expressar claramente porque está tomando essas medidas.
“Os elementos técnicos que Campos Neto deveria seguir — de acordo com o que prega o estatuto do regime de metas de inflação —, não está sendo seguido. Ora é o núcleo de inflação, ora expectativas. Ele está criando elementos”, afirma Roncaglia.
Por fim, o economista reconhece a pressão da inflação, em especial a que vem do setor de serviços. Mas acredita que os números mostram uma desaceleração que permitiria uma porta aberta para redução dos juros.
“À medida que os choques inflacionários diminuem, os serviços têm peso para adicionar preços além do que energia e alimentos podem amenizar. Daí até dizer que nós temos um problema de demanda, está muito distante”, diz.
Um meio termo
A economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena Veronese, entende que o cenário atual está mais claro do que estava na reunião anterior do Copom, com mostras de que a inflação ainda preocupa, mas está desacelerando.
Além disso, há um “encaminhamento” do arcabouço fiscal. Ou seja: mesmo que a proposta não esteja aprovada, ela está esclarecida. Ainda que sofra alguma alteração no Congresso Nacional, as bases estão dadas agora de forma que não estavam na reunião passada.“Uma sinalização, como aconteceu na última reunião, de que o BC pode voltar a subir a taxa de juros já não faz mais sentido”, diz Veronese. A economista afirma que o BC esperava uma definição da questão fiscal e ainda pode levantar argumentos para não cortar os juros já na reunião de junho, mas que o país está caminhando para uma redução das taxas por questões puramente conjunturais.
“A atividade está desacelerando, o mercado de trabalho não está mais tão aquecido e o mercado de crédito, principalmente, está caindo. Tudo isso é fruto de juros altos e de endividamento das famílias”, afirma.
Fonte: G1