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Unicórnio também precisa desacelerar, explica Fernanda Weiden, da VTex

A executiva Fernanda Weiden foi contratada, em janeiro de 2022, como CTO da VTex, um unicórnio multinacional brasileiro, plataforma de comércio digital para grandes empresas e varejistas. A conquista do cargo a colocaria em evidência no cenário de inovação brasileiro em quaisquer circunstâncias – mas a novidade se tornou ainda mais chamativa por ela estar em final de gestação naquele momento. Fernanda costuma dizer que a construção de seu roteiro profissional misturou atenção às oportunidades, disposição para experimentar o novo e manutenção de uma rede de contatos forte.

A atenção à oportunidade a colocou no rumo atual. Estudava matemática para ser professora, mas em 1995 percebeu que a internet transformaria o Brasil e o mundo ainda mais rapidamente do que se esperava. “Iniciei minha jornada autodidata na área, já que não sou formada em ciência da computação”, conta. “Depois, minha insegurança acabou me ajudando. Eu não me sentia confiante e decidi fazer um programa de certificação na Red Hat, que atua com soluções empresariais de software open source”. Tornou-se a primeira mulher na América Latina com essa certificação.

A partir daí, sua carreira deslanchou. Trabalhou em gigantes de tecnologia, como IBM, Google e Facebook. Uma de suas causas atuais é levar mais mulheres para a área. Quer mudar as regras do jogo corporativo, ainda muito masculinas, mas não acha que ninguém precise esperar isso ocorrer. “Sei que as condições para as mulheres no ambiente de trabalho não são ideais, mas isso não pode ser o centro da discussão. É mais poderoso ocupar os espaços, fazer a mudança e abrir a cabeça das pessoas com relação ao tema”, afirma.

ÉPOCA NEGÓCIOS – Muitas mulheres ainda têm receio de engravidar e adiam a maternidade por conta da carreira. A sua trajetória mostra que é possível conciliar os dois papéis. Antes de ser contratada grávida pela VTex, você já tinha recebido um convite para o conselho da Único quando sua primeira filha tinha um ano. Como um papel afeta o outro?
Fernanda Weiden
– A maternidade traz uma importante e nova motivação para as profissionais, pois sabemos que existe mais alguém dependendo de nós e para quem queremos oferecer o nosso melhor, prover educação de qualidade e diversas experiências. O fato de servir como modelo também tem um peso enorme. Quero que minhas filhas me vejam como uma pessoa realizada, feliz, que se desafia a alcançar novos patamares. Quero que elas se inspirem a também ir atrás dos seus objetivos e sonhos.

Em relação às competências, no meu caso, sinto que a maternidade diminuiu muito a minha ansiedade para resolver tudo o mais rápido possível, principalmente no trabalho. Quando você está ansiosa para entregar algo logo, dificilmente consegue a melhor solução. Me vejo muito mais equilibrada depois que me tornei mãe, e pensando na vida profissional, como meu trabalho depende muito da tomada de decisões, ter mais equilíbrio para isso é um grande diferencial.

NEGÓCIOS – O que é preciso fazer para aumentar o número de mulheres nas lideranças? Uma pesquisa da Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostra que apesar de 87% das companhias pensarem em ampliar a diversidade entre os funcionários, só 60% promovem, de fato, a inclusão.
Fernanda
– Sempre falo que precisamos sair do clichê corporativo do ‘vamos criar um programa de diversidade’, como se isso bastasse. Muitas empresas acham que apenas desenvolver um programa é o suficiente. Diversidade não é só uma ação ou meta. São diversas ações, algumas simples, outras complexas. É trabalho contínuo e constante, que não vai acabar nunca. Como a contratação é pensada? Como você escuta as vozes mais quietas da sala? Como tem trabalhado para tornar os times receptivos a opiniões diferentes e perspectivas diferentes? Há mulheres, negros ou LGBT+ em cargos de liderança?

Na VTex, trabalhamos para mostrar que qualquer pessoa pode crescer. Além de mim, há outras cinco executivas no time de liderança de tecnologia: Renata Lorenz, vice-presidente de Produto; Letícia Faria, vice-presidente de Operações Técnicas; Anaterra Oliveira, diretora de Engenharia; Laura Lessa, diretora de Design; Michelle Ribeiro, head de Segurança; e Paula Fonseca, diretora de Tech Workforce Expansion. Diversidade é essencial. Se você colocar em uma sala apenas pessoas que pensam igual, ninguém evolui.

Durante toda a minha carreira participei de muitos treinamentos que me explicavam como jogar esse jogo corporativo, que é predominantemente masculino. O que precisamos é mudar essa lógica. E quando você introduz mais lideranças femininas nas empresas, começa a modificar essas regras. Você não está mais dizendo para todas as mulheres que elas precisam se adaptar à lógica masculina, mas mudando a forma como o jogo é jogado. Isso precisa acontecer para que os ambientes corporativos sejam mais receptivos para mulheres e à diversidade em geral. É importante que as mulheres se vejam nesses espaços e percebam que existe essa possibilidade. Aquela coisa da menina que vê uma mulher se tornando presidente ou uma garota negra que vê a Maju na TV com o mesmo cabelo que ela. É conseguir se enxergar nos lugares.

NEGÓCIOS – O time de tecnologia da VTex dobrou nos últimos dois anos e a empresa tem planos de expandir a atuação para além do mercado latino-americano, para regiões como Europa e Estados Unidos. Qual o seu papel nessa expansão?
Fernanda
– O primeiro ponto é cuidar de tudo internamente. O time precisa se sentir cuidado, visto e parte da estratégia de crescimento. É dessa forma que temos profissionais produtivos e engajados. É o foco do começo do meu trabalho. A empresa contratou muitos profissionais nos últimos dois anos e meu papel agora é incentivar o time a desacelerar um pouco para respirar e, assim, retomar a caminhada. A minha proposta é gerar um crescimento mais intencional, ou seja, refletir sobre o que estamos fazendo e os pilares que precisamos trabalhar para chegar onde queremos. Nem sempre a contratação é a solução. Muitas vezes, é preciso aperfeiçoar processos ou a infraestrutura de software, além de potencializar a produtividade do time com ferramentas que ajudem isso a acontecer.

Em relação à expansão para os outros países, nosso time está focado agora em questões como confiança, privacidade e segurança. O mercado americano, por exemplo, é muito exigente nesses pontos, assim como o europeu, que conta com uma legislação de privacidade que é modelo para outros países.

O trabalho, agora, é construir o equilíbrio. De um lado a tecnologia e o produto e, de outro, o que o cliente quer, o que é importante para a empresa e quais são os pontos que estamos trazendo para a mesa e para o mercado. Assim, conseguimos definir as prioridades do time, gerando uma disciplina de confiança. Confiabilidade é um tema crucial para nós.

NEGÓCIOS – Qual a palavra da moda, frase pronta ou clichê corporativo você não aguenta mais ouvir e por quê?
Fernanda
– Tem algumas… uma delas é “queremos ser uma big tech”. Alcançar esse patamar não é apenas um desejo, é preciso pensar no que você está fazendo para chegar lá em termos de investimento em cultura, em engenharia, em pessoas… Como encara a questão de employer value proposition? O que está entregando de valor às pessoas para que elas queiram fazer parte da sua empresa? Hoje, todo mundo quer ser uma big tech. E apenas querer não faz ninguém chegar muito longe. Às vezes, há um pouco de discrepância em relação ao discurso e a vontade de se comprometer, de fato, com as mudanças que vão levar a esse patamar.

NEGÓCIOS – Qual foi sua melhor decisão profissional?
Fernanda
– A mais contraditória, mas que acabou sendo a melhor decisão que tomei, foi sair do Google para ir trabalhar no Facebook, que ainda estava no começo da jornada, ganhando muito menos. Na época, o Google já era uma empresa de 30 mil funcionários, bem estruturada e com sucesso. Já o Facebook contava com apenas 5 mil colaboradores e estava se estruturando e em fase pré-IPO. Aprendi muito lá como gestora e participando do crescimento da empresa.

NEGÓCIOS – E a pior decisão profissional?
Fernanda
– A pior está muito relacionada à Síndrome da Impostora. Eu comecei três graduações e um mestrado e abandonei todos os cursos. Às vezes, fico me perguntando “será que fiz isso porque não consigo me comprometer comigo mesma o suficiente?”. Talvez tenha sido um pouco disso, mas era como tinha que ser. Acredito que em alguns momentos da vida, as borboletas do nosso estômago estão dizendo para fazermos uma coisa e nossa cabeça outra. Em alguns, eu não escutei as borboletas e minhas decisões não foram as melhores.

NEGÓCIOS – Qual o seu melhor hábito e pior hábito?
Fernanda
– O melhor, que sempre foi natural para mim, é me importar muito com as pessoas na vida profissional e pessoal. Realmente me interesso pela vida de todos, quero saber o que é importante para cada um. Minha maior paixão é lidar com as pessoas.

NEGÓCIOS – E o pior hábito?
Fernanda
– O pior é a procrastinação. Gostaria de ser aquela pessoa que organiza tudo e termina as atividades antes, mas sempre deixo tudo para o último minuto.

NEGÓCIOS – Qual série de TV você mais gostou nos últimos tempos?
Fernanda
– Assisti a duas temporadas de Ted Lasso (série disponível na Apple TV+) e gostei muito. A história é sobre um treinador de um pequeno time de futebol americano de faculdade, nos Estados Unidos, que é contratado para ser o técnico de um time de futebol profissional na Inglaterra, mas ele não conhece as regras e tem pouca experiência. Para mim, há muitas analogias com gestão. Cheguei à VTEX agora e estou aprendendo sobre e-commerce e sobre a cultura da empresa. E me sinto meio Ted Lasso. Além disso, esse treinador é muito preocupado com as pessoas, com as relações que constrói no time. Uma cena o mostra falando com um jogador que guardava rancor de tudo. Aí ele pergunta: “sabe qual é o animal mais feliz do mundo?” O jogador diz que não e ele responde: “O peixinho dourado. Sabe por quê? Ele tem uma memória de 10 segundos. Be a gold fish!”. Ou seja, não guarde rancor e você vai ser mais feliz. Pra mim, é um jeito descontraído e totalmente diferente de olhar a gestão.

Fonte: Época Negócios

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